Houve um tempo em que não existia um canto de Espanha ao qual não se pudesse chegar de comboio. Com a melhoria das estradas e o crescimento do automóvel, a maioria desses caminhos de ferro desapareceu, mas muitos foram transformados em vias verdes de uso exclusivo para peões e ciclistas. O que oferecem? Paisagens singulares, percursos afastados das grandes infraestruturas rodoviárias e, o mais importante, paz, silêncio e inclinações muito moderadas.
Via Verde de La Camocha (Gijón, Astúrias)
Que paisagens liga e para que foi utilizada?
A Via Verde nasce a sul de Gijón, nos arredores da cidade, e liga ao antigo couto mineiro e aos poços de extração de carvão de La Camocha, situados a sete quilómetros. A antiga linha férrea servia para escoar todas as toneladas de carvão extraídas das minas e transportá-las até ao porto de El Musel, em Gijón.
Qual é a sua história?
Teve uma história breve, mas intensa. Foi criada em 1949, quando a mina já estava em funcionamento há cerca de 15 anos, e encerrou em 1986, quando o transporte rodoviário substituiu os caminhos de ferro. Muitas das 29 milhões de toneladas de carvão extraídas passaram por esta via, agora asfaltada e ladeada por muros em muitos trechos, que hoje recebe ciclistas e caminhantes.
Por que percorrê-la?
- Porque oferece um percurso completo desde o Gijón mais industrial até ao mais rural, revelando toda a sua diversidade social e paisagística: desde palácios como o da Duquesa de Riansares a casas agrícolas asturianas — como a da Rubiera — acompanhadas de hórreos e celeiros, e claro, as torres dos poços da mina de La Camocha.
- Porque é uma viagem ao passado mineiro de Gijón, um passado ainda recente: na verdade, não passaram nem 20 anos desde o encerramento da mina de La Camocha em 2007.
- Porque, uma vez chegado à mina, é possível completar o percurso com a Rota Fluvial do rio Llantones (que segue para norte) e a do rio Piles, atravessando densas florestas ribeirinhas até às portas de Gijón.
Via Verde do Pas (Cantábria)
Que paisagens liga e para que foi utilizada?
Pode-se dizer que une duas das Cantábrias mais vibrantes: a costeira e a pasiega. Liga uma antiga localidade industrial da baía de Santander, Astillero, a Ontaneda, no coração dos Vales Pasiegos. Ao longo dos seus 34 quilómetros, o percurso passa de uma zona industrial e urbanizada para paisagens idílicas de uma Cantábria rural, com rios de salmonetes, pastagens verdes onde o gado se alimenta e montanhas, muitas montanhas.
Qual é a sua história?
Criada em 1902 para ligar Santander a Burgos através do vale do rio Pas, a linha férrea nunca passou de Ontaneda, já nos limites da Cantábria. Várias razões impediram o avanço para além deste ponto, sendo a construção do caminho de ferro de via larga Santander-Mediterrâneo uma das principais. Ainda assim, o comboio do Pas funcionou, prestando serviço aos habitantes dos vales dos rios Pas e Pisueña, até ao seu encerramento definitivo em 1973.
Por que percorrê-la?
– Porque são 34 quilómetros de total desconexão e verdadeiro luxo. Um caminho afastado do ruído do mundo onde se pode pedalar ou caminhar com toda a tranquilidade.
– Porque atravessa uma quantidade impressionante de recursos turísticos da Cantábria, tão ricos quanto variados:
- Vilas termais do século XIX como Puente Viesgo.
- Construções medievais como a colegiada de Santa Cruz de Castañeda, com uma bela igreja românica e valiosas peças góticas no seu interior.
- As grutas pré-históricas com arte rupestre do monte Castillo, junto a Puente Viesgo, declaradas Património Mundial pela UNESCO: Las Monedas, El Castillo, Las Chimeneas e La Pasiega.
- Espaços naturais como o Parque Natural Maciço de Peña Cabarga, as florestas ribeirinhas que acompanham a via verde ou os prados pasiegos, muitas vezes em encostas impossíveis, que surgem à medida que se sobe o rio Pas.
Via Verde de Compostela-Tambre-Lengüelle (A Coruña, Galiza)
Que paisagens liga e para que foi utilizada?
São 29 quilómetros intermédios da antiga linha ferroviária que ligava A Coruña a Santiago de Compostela. Trata-se de um percurso por uma Galiza eminentemente rural e discretamente afastada das principais estradas. As antigas linhas de comboio acompanham os rios Tambre e Lengüelle e os seus meandros, garantindo ao longo do caminho fabulosas paisagens de margem fluvial.
Qual é a sua história?
Apesar da importância das duas cidades que ligava, esta linha ferroviária teve uma vida atribulada: passaram-se mais de 50 anos desde o planeamento inicial, em 1864, até ao início das obras. As dificuldades técnicas de construção na Galiza e a Guerra Civil atrasaram a abertura da linha até 1943. O último comboio circulou em 2011, dando lugar à atual via verde: todos aqueles esforços permitiram, pelo menos, que hoje caminhantes e ciclistas possam desfrutar do traçado do passado.
Por que percorrê-la?
- Porque permite conhecer uma Galiza autêntica, muito próxima de dois grandes centros urbanos, mas pouco conhecida, através dos concelhos de Oroso, Ordes, Tordoia e Cerceda, ao longo da via verde mais longa da Galiza.
- Porque todo o percurso é um miradouro privilegiado para caminhar em paz por entre paisagens fluviais extraordinárias do rio Lengüelle, sobre um piso de asfalto e terra compactada, alternando sombras de bosques com campos agrícolas e pastagens.
- Para descobrir as acolhedoras estações de comboio reabilitadas, que evoc
Via Verde dos Montes de Ferro (Bizkaia, Euskadi)
Que paisagens conecta e para que foi utilizada?
Trata-se de uma viagem, literal, às entranhas do Grande Bilbao e às minas que deram origem aos famosos Altos Fornos da Biscaia e, por consequência, à indústria que caracterizou durante décadas esta parte do País Basco. Esta Via Verde é a soma de duas já existentes, Itsaslur/Campomar e a de Galdames ou La Galdamesa, que conectam a comarca de Las Encartaciones com a costa. São quase 40 quilômetros entre Traslaviña e o bairro de Pobeña, em Muskiz, o toque final perfeito. A antiga ferrovia era utilizada para transportar minério de ferro do coração de Las Encartaciones até os carregadouros da costa.
Qual é a sua história?
Em 1876, a companhia inglesa Bilbao River Cantabrian Rail inaugurou os 22 quilômetros de trilhos que ligavam as minas do município de Galdames aos cais de Sestao. A ferrovia não transportava apenas o minério das suas próprias minas, mas também o das minas vizinhas localizadas nas proximidades. O trabalho não terminava aí: com a existência do transporte, os mineiros começaram a construir suas casas na difícil orografia próxima à linha, dando origem a novos bairros. Em 1972, quase um século após a sua criação, a baixa rentabilidade das minas provocou o desmantelamento da ferrovia.
Por que percorrê-la?
- Porque é uma forma de conhecer as paisagens mais rurais da revolução industrial que ocorreu nesta parte de Bizkaia nos séculos XIX e XX. O que hoje é um vale idílico, fervilhava de intensa atividade mineradora (visível nos carregadouros de minério, nos fornos de calcinação ou nas antigas minas a céu aberto) que o tempo e a vegetação vão apagando pouco a pouco.
- Porque permite descobrir um canto do País Basco com pouquíssima visibilidade nos guias turísticos, com atrativos como a ferraria El Pobal, o Centro de Interpretação da Mineração de Peñas Negras e La Arboleda, as dunas da praia de La Arena ou as montanhas de Triano.
Pelo prazer de caminhar ou pedalar por um dos trechos ferroviários mais bonitos da Espanha, o de Itsaslur, com 3,5 quilômetros, por onde passava a ferrovia mineradora que transportava o minério da companhia Mac Lennan de Kobaron até a lavadora e o carregadouro de Campomar.